Virgem e Prostituta

Este par arquétipo - criança e velha - se vê complementado por outra oposição entre a virgem e a prostituta. Aqui o antigo simbolismo da Virgem não expressa a negativa a ser fecundada, mas o contrário, a profunda quietude da substância que aguarda, em sua entrega, ser impregnada pelo outro pólo da união. A plasticidade e inocência se reúnem com o silêncio e a confiança - a sabedoria da função lunar - renunciando a reproduzir as velhas marcas, entregando-se por completo as forças de formação. O arquétipo virginal contém assim a possibilidade de se renovar barrando as voltas do passado, mas não a partir de uma atividade positiva e sim inibindo e demorando em sua reprodução, a fim de que a nova fecundação seja tão profunda como para cancelar todas as pegadas anteriores.

O oposto à isto se simboliza tradicionalmente com a prostituta, em quem se arquetípica a ânsia da atividade lunar para entregar-se a forma, respondendo voraz e mecanicamente a qualquer estímulo para construir de imediato sobre ele, com frenesi, para repetir, em resposta a impulsos superficiais, ao mesmo padrão de crescimento pelo próprio crescimento.

Esta hiperatividade a arrastará a uma desordem destrutiva, como nos casos dos tumores cancerosos nos quais a atividade celular se torna independente por completo dos limites da forma que lhe corresponde.

Em planos psíquicos, por outra parte, esta dimensão aparece na excessiva excitação da imaginação, quando não pode deter suas construções e invade desmedidamente a percepção do mundo. Também se relaciona com o desencadeamento de pensamentos incontáveis, que recorrem várias vezes aos mesmos circuitos quando o temor invade, retirando toda a possibilidade criativa.

Esta exasperação da qualidade de entrega, em um ritmo que anula a existência do outro pólo e se fecha sobre si em uma auto-suficiência destrutiva, é uma tendência possível da função lunar, em seus múltiplos planos de manifestação.

Criança e Velha

Como dissemos antes, a Lua jamais existe com independência dos outros corpos do sistema solar. A natureza global do processo irá intervir em outras funções e estas, a seu devido tempo, limitarão os excessos ou complementarão as limitações dos primeiros passos.

Mas, para a consciência que não compreende ainda a ordem profunda dos ciclos, a Lua se apresenta a sua vez como criança e outra como velha. Recém nascida e assim mesmo carregada pelas marcas do tempo. Por um lado fresca e vulnerável, vital e inocente, cheia de possibilidades e aberta a todas as possibilidades, neste tema, o arquétipo reflete a falta de completude e a disponibilidade inerentes a sua natureza primária e indiferenciada. Mas por outro lado, a sombra desta mesma qualidade faz com se acumule marca sobre marca, ficando sua vitalidade atrapalhada nelas até perder-se em uma incessante reprodução de formas que drenam toda a sua energia. Assim, sepultada uma crosta de construções que impedem toda a renovação, se converte em estéril. Esta velha, por um lado exibe toda a sabedoria da experiência e os tesouros da memória, mas ao mesmo tempo leva consigo a rigidez do passado e suas cristalizações, perdendo toda a capacidade de resposta e estímulos do presente.



Neste caso, a função lunar se identifica por completo com o seu complementário, Saturno, é uma esclerose que repete de forma incessante os mesmos padrões. As regressões que padecem os velhos afetados pela sedimentação de um sistema circulatório, expressam a outra face desta polaridade nos velhos que se convertem em crianças.

A Lua e a Memória


Vejamos isso com mais detalhes. Sua enorme plasticidade e sensibilidade fazem com que o luar fique marcado por outras funções: radiação solar, impulso marciano, estrutura saturnina, maneira de formação jupiteriana, informação mercuriana ou criatividade uraniana. Mas sua função específica é, precisamente, proporcionar a substância capaz de reter a marca, repetindo-se até que fique estabelecido uma forma ou padrão. Isso ocorre, por exemplo, na pele onde superado alguns estímulos externos, fica a cicatriz.

A Lua atesora tudo aquilo que se imprime nela e se configura ao seu redor, seguindo o caminho marcado. É memória no sentido mais extenso da palavra porque retém todos os impactos externos que a afetam e toma progressivamente a forma dos sulcos que se abrem nela, alimentando-os com sua vitalidade. Neste sentido, aquilo que aparece no princípio como primário, virginal e indiferenciado, se converte com o tempo em constante acumulação de marcas e incansáveis repetições do passado, rechaçando em sua inércia os estímulos do presente. Ali se fecha sobre si e o crescimento se detém na réplica indefinida do nível alcançado.

A Lua é o bebê, o intocado e também a identificação plena com as experiências anteriores e a incapacidade de dar respostas novas por excesso de acumulação: é ao mesmo tempo o envelhecimento e a sensibilidade. Sua relação estrutural com Saturno nos mostra que a Lua é simultaneamente jovem e velha, virginal e cristalizada. Aqui aparece novamente sua dinâmica profunda: desenvolver-se em fases, isto é, recorrer no processo em que nasce, cresce e adquire sua plenitude até finalmente cristalizar-se e extinguir-se necessariamente, para voltar a nascer.

Toda a reflexão a cerca da Lua está inevitavelmente atravessada pelo arquétipo de suas caras: uma luminosa e visível, a outra escura e invisível. Nada que se diga sobre ela pode escapar desta tensão, pela qual uma qualidade se transforma subitamente em seu oposto, ou uma limitação ou carência se revela como potência e vitalidade. Falarmos da Lua nos leva a recorrer um conjunto de atribuições carregadas de ambivalência, nas quais é impossível decidir sobre sua intrínseca qualidade criativa ou destrutiva, independentemente do que se manifesta ao seu redor. Na realidade recortar um fragmento de seu contexto, autonomizando-o e convertendo-o em absoluto para a consciência que ficou absorvida por ele, é um comportamento lunar que será falado mais adiante e que tem enormes consequências psicológicas. Constataremos por hora que a mesma dinâmica da Lua mostra os opostos como fases necessárias de um processo: de Lua nova, abismal e escura, a Lua cheia, abundante e luminosa e vice-versa. É a consciência, incapaz de compreender, quem divide o processo e experimenta como tensão a consciência do “bom” e do “mau” em um mesmo “objeto”. Isto é uma determinação psicológica, uma fixação que se projeta em tudo aquilo que se absolutisa e não algo inerente ao mesmo processo. No plano psíquico, a articulação da Lua ao resto do sistema dependerá da capacidade de consciência para realizar esta distinção.

B - A Forma

A segunda tendência fundamental da Lua que aqui podemos distinguir em sua enorme plasticidade - dado sua diferenciação - e sua docilidade para responder a uma ordem impressa na substância, a fim de tomar determinada forma ou outra. Neste caso, a inteligência do código genético que ficou constituído a partir da união dos gametas, irá determinando as características específicas que a massa celular deverá tomar - através de “instruções”- até transformar-se em órgãos definitivos: fígados, rins, unhas, pernas... A partir daí a vitalidade celular já não responderá a novos impulsos de formação e só se renovará periodicamente, movendo-se dentro de um padrão estável e definitivo.

Neste exemplo de nível biológico podemos visualizar várias características lunares que mais tarde reconheceremos em outros planos: sociais, psíquicos, mentais etc. Estas são:

1 - a relativa e indiferenciada que possibilita sucessivas transformações até dar lugar a uma forma final;

2 - a plasticidade e receptividade aos métodos de formação com os quais incorporam a forma, para logo ater-se a ela;

3 - a alta vitalidade do lunar, até que se reproduza continuamente em si mesma, mantendo a forma incorporada;

4 - a capacidade de renovação em resposta a uma ordem determinada, que a leva a incorporar uma diferença sobre a base do padrão anterior. No exemplo, isso ocorre ao passar do endodermo às células do futuro sistema digestivo e, mais tarde, destas a cada um dos órgãos específicos.

A - Substância

A Lua se refere sempre a substância de certo nível de existência - física, biológica, psíquica, social, mental - isto é, ao substrato indiferenciado do qual surgirão às formas desse nível de realidade. É a matéria prima, disponível para adotar as formas necessárias que expressam uma determinada dimensão. Em tantas substâncias vitais e anéis de reprodução de si mesma, entregando-se as estruturações e princípios formativos que atuam sobre ela, expressa sua analogia com Touro, daí sua exaltação nesse espaço zodiacal.

Podemos exemplificar com maior clareza este conceito e suas ramificações descrevendo o desenvolvimento de um embrião, onde ali começa a vida está particularmente presente o acionar da Lua.

Na união entre mamíferos, uma vez reunidos os gametas no útero começa uma rápida segmentação de células praticamente indiferenciadas. Estas possuem uma enorme vitalidade e proliferam até dar lugar a uma primeira diferenciação entre elas, com o surgimento de três tipos de tecidos diferentes entre si, ectoderma, endoderma e mesoderma. As células de cada um desses tecidos terá um destino específico em cada tipo de órgão, ao final de uma série de transformações que partem de uma origem comum. O aparelho respiratório e o digestivo surgirão do endoderma através de sucessivos passos, o sistema nervoso se constitui a partir do mesoderma e assim o resto, de maneira semelhante. O importante para nós é perceber como as futuras formas finais (órgãos) são transformações progressivas de tecidos básicos que ministram a substância, primeiramente a sistemas inteiros (respiratório, digestivo, nervoso, estrutura óssea, etc.) e mais tarde se diferenciam em órgãos particulares (pulmões, traquéia, estômago, fígado, pâncreas, etc.).

Nesse sentido, aqui a Lua é uma proliferação de tecido (relativamente) indiferenciado no qual se enfatiza a tendência a repetir-se, até o momento de uma nova formação complexa da substância (o tecido) a fim de produzir um útero diferenciado.

Uma reprodução de tal intensidade e velocidade - podemos falar de um frenesi de auto-reprodução - responde a necessidade do sistema global de substância, de contar com materiais primários em abundância para sua posterior complexidade, até alcançar as formas finais.

A Função Lunar

Tomamos como certo, então, a presença do triângulo Lua - Sol - Saturno para toda a manifestação lunar, aparecem dois aspectos essenciais da realidade, significados pela Lua, que delimitam sua função em um sistema. Por um lado ministrar substância para que esta tome uma forma determinada. Por outro - ao mesmo tempo - construir um hábito protetor para que dentro dela, protegida e nutrida, se desenvolva uma diferença que seria destruída sem o amparo deste hábito.

Podemos exemplificar este duplo processo nos referindo a substância básica que constitui o ovo. Esta inclui tanto as células indiferenciadas que contêm o futuro pólo como os nutrientes destinados ao seu crescimento, o receptáculo corporal em que este fica até sua fecundação, o ovo mesmo como estrutura total, e inclusive o futuro ninho e a posterior tarefa de encubamento. Tudo isso é a Lua, a qual nos mostra a característica básica de sua dinâmica: ela sempre aparece em um processo onde cumpre múltiplas funções, simultânea e seqüencialmente. Atentos a isto, definiremos primeiro por separadas as diferentes funções da Lua para podermos encontrar depois o dinamismo de seu significado completo. Ali, poderemos, ao mesmo tempo, registrar nossa dificuldade para sintetizar aspectos da realidade que habitualmente manteremos escondidos.

O sistema Lua - Sol - Saturno

Ao tentarmos delimitar os significados da Lua em um texto relativamente introdutório, um excesso de simplificação distorce perigosamente aquilo que se tenta transmitir. Poderia se ver o essencial, ou seja, a presença da estrutura do sistema em cada uma de suas partes e, neste caso, a relação intrínseca entre a Lua e a totalidade da matriz .



Convenhamos, então, que falar dos significados simbolizados por um planeta independente dos demais é uma abstração válida em termos iniciais de uma pedagogia, mas incorreta fora desse contexto.

Por exemplo: dizemos que o útero está simbolizado pela Lua, mas devemos ter presente que o útero não existe independente do resto do organismo e que, em particular, aparece associado a determinadas características da pélvis. Sem pélvis não há útero e a pélvis dos corpos femininos está determinada pela presença deste e suas funções associadas.

Ambos constituem uma estrutura. Não existe em sem o outro, não se manifestam independentemente.

Sua correlação astrológica expressa que a manifestação do luar se corresponde sempre com uma determinada presença de Saturno. Saturno e a Lua constituem uma relação entre opostos extremamente necessária. A vulnerabilidade e indiferença lunar “necessita” da presença de estruturas saturninas e estas cobram sentido como complemento daquela; se dão com ela. No oposto, a manifestação física da Lua é o contrário de suas qualidades astrológicas. Neste corpo específico que gira ao redor de nosso planeta tem lugar à máxima mineralização e cristalização de uma entidade sem vida, desligada de todo o processo oxidante ou radiante. Do mesmo modo se pode dizer que um ovo é a “Lua”, mas a casca é Saturno. Ao mesmo tempo, leva dentro de si o Sol da vida nascente que ainda não pode se manifestar e necessita ser protegida: ou seja, que tão pouco há Lua sem Sol. Inversamente, não é possível para nós a presença do Sol sem a Lua, no sentido de proteção necessária à respeito da radiação solar. Isto pode ser representado pela camada de ozônio, pela atmosfera que nos rodeia, pelas casas e refúgios ou, basicamente, pela noite que nos protege do excesso do fogo solar e que se manifesta ritmicamente de acordo com um tempo e uma medida. A Lua, Saturno e o Sol são uma estrutura e sempre aparecem unidos, ainda que em proporções diferentes. A dinâmica cíclica destas proporções é aquilo que nós percebemos como “processo”.

O sistema solar completo apresenta, em rigor, este funcionamento, em conseqüência, todas as suas funções são mutuamente necessárias.

Toda manifestação é o emergir de um equilíbrio relativo das mesmas, isto é, de uma proporção heliográfica. Esta temática não será aprofundada aqui, mas é necessário tematizar uma lógica mais complexa que o habitual pensamento causal e seqüencial para poder dar conta dessas estruturas e chegar a captar a presença da totalidade do sistema em cada situação. Para os propósitos do presente texto nos limitaremos a contextualizar as descrições da função lunar dentro da relação estrutural entre a Lua, o Sol e Saturno, a fim de alcançar uma maior precisão, postergando uma discussão mais complexa e rigorosa para o momento em que abordarmos o estudo das polaridades planetárias.

A astrologia como linguagem sagrada


Inversamente, em toda a linguagem mandálica cada um de seus elementos recria a matriz global. Cada elemento contém dentro de si todos os demais e suas relações com as outras partes do sistema são à sua vez “internas” e “externas”, como correspondente de uma linguagem cuja função é a de comunicar a profunda unidade na diferença do que está “dentro” e o que está “fora”. Estas são linguagens sagradas - como a Cabala, o I-Ching ou a Astrologia - e em sua própria natureza reside a possibilidade de chegar a totalidade através de cada uma de suas partes, como um jogo de caixas. Daí, que ser função da astrologia significa ser a ressonância mutua das entidades do sistema solar em seus diferentes planos, cada um de seus símbolos deve evocar os demais em uma gama de ressonâncias infinitas e a sua vez extremamente precisa.

Por isso, a astrologia exige o desenvolvimento harmônico das funções aparentemente contraditórias: a capacidade de permanecer em contato com totalidades sem classificá-las de forma separada e, a sua vez, a capacidade de discriminação que permite estabelecer diferenças. Em geral, uma função se desenvolve em detrimento de outra e o hábito de apoiar-se só na primeira inibe a participação da função complementaria em processo perceptivo. O correto vínculo entre o contato e discriminação - ou, mais profundamente, entre identificação e diferenciação - é um requisito fundamental para a compreensão da astrologia e o legado que oferece a quem entra nela.

Este é o movimento em um fio de navalha, onde um excesso de uma função discriminadora - ou melhor, da necessidade de afirmar-se nela para não cair na confusão - converte a astrologia em um mero instrumento da consciência identificada com a linguagem separatista. Isso a empobrece, reduzindo-a em um sistema de classificações, topologia e determismos pretendidamente científicos, que nos prejudicam no mistério que é inerente e impedem que sua contemplação nos transforme.

A inibição da função discriminante e a hipertrofia da identificação nos leva, pelo contrário, a contaminação de todos os significados e finalmente desemboca na confusão e ao delírio. Uma linguagem operando em uma psique que tenha efetuado um profundo trabalho de discriminação à respeito das identificações primárias, e de individualização das estruturas arquetípicas, é sumariamente perigosa. Conserva a possibilidade de projetar massivamente conteúdos indiscriminados sobre o mundo, com a conseguinte desordem e confusão. Sendo que esta projeção, cedo ou tarde, provém de extratos que estão além do pessoal, e com os conteúdos do inconsciente coletivo, ainda que contaminados, são capazes de expressar em seu nível a sincronicidade entre o “dentro” e o “fora”, esta atitude expressa ocasionalmente uma grande “sabedoria” e uma intuição certeira. A maioria das vezes se trata de associações totalmente subjetivas e fantásticas.

Na realidade, a primeira posição - o excesso de discriminação - tem na segunda - a identificação - em sombra. Uma vez em contato com a linguagem astrológica, se ativam inevitavelmente os potentes conteúdos sintéticos que lhe são próprios e produzem um efeito emocionante sobre a psique não preparada. Aqui, a ênfase na discriminação é resultado da resistência e em última instância de auto-proteção. Como este movimento não é consciente, inevitavelmente enrijece e reforça os aspectos obsessivos e controladores em quem toma esta posição.

É claro que entrar na astrologia é entrar em um terreno anterior as modernas diferenciações entre ciência, arte, magia, medicina, religião, psicologia ou cosmologia. Não é fácil não perder-se nela e por isso oscilamos entre cientificismo e misticismo, psicologismos e determismos. É possível - e este é um desafio - avançar prudentemente, guardando fidelidade as premissas que fazem com que a astrologia tenha efeito. Isto é, movermos em um nível de aprendizagem em que se faça manifesta a correspondência estrutural entre o “dentro” e o “fora”, a psique e o cosmos, o céu e a terra.

Uma crença não questionada

Antes de tentar responder essa pergunta (Qual é então, a função correspondente da Lua em qualquer sistema?) é preciso que nos detenhamos em um ponto importante. Ao tratar de delimitar o significado dos diferentes símbolos da astrologia, sejam estes espaços zodiacais, proporções angulares - aspectos - áreas de experiências - casas - ou corpos do sistema solar, devemos previamente ter claro uma suposição inconsciente própria da linguagem convencional, que se projeta sobre a estrutura do simbolismo astrológico produzindo nele uma forte distorção.

Refiro-me a crença de que cada símbolo pode ser definido independentemente dos demais e tem, por tanto, existência autônoma. Em conseqüência, se assim fosse, poderíamos identificá-los atribuindo significados de exclusão do tipo: “o guerreiro corresponde a Marte”, “a rosa à Vênus”, ou “as religiões à Júpiter”, com independência de todo o contexto em que apareçam estes aspectos de realidade. Esta crença supõe que existe um significado “em si” para Touro, o Sol, a casa três ou sextil.

Se esta suposição básica da astrologia nos diz que a totalidade está em cada uma das partes em proporções diferentes - ou como variantes particulares de um padrão geral - a crença anterior não pode ser válida. Dito de outra maneira: se em cada carta natal estão presentes todos os signos, aspectos, planetas, etc., em uma distribuição particular (proporção - padrão), é uma abstração afirmar que existe alguém puramente mercuriano ou taurino.

Na realidade, não se vê Mercúrio separado do sistema solar, ou Touro independentemente da totalidade do zodíaco, ou uma quadratura em uma situação em que não existam ao mesmo tempo trígonos, sextis ou oposições. Em um dado instante, podemos dizer que a configuração particular é máxima em relação a outras, mas estas estarão sempre presentes, ainda que sua proporção não seja particularmente significativa.

No que se refere a Lua, não há situação possível em que esta apareça sem o Sol, Mercúrio, Saturno ou qualquer outro planeta. É provável que uma intensidade particular da Lua relegue a um segundo plano a consideração dos demais corpos do sistema, mas isto é sempre relativo e só justificável com a simplificação operativa.

Indagar a cerca destas crenças é fundamental. Ao não questioná-las supomos que é possível definir a Lua - ou a Júpiter, ou a Aquário - com total independência dos demais elementos da matriz a que pertencem. A crença que considera possível pensar o simbolismo astrológico - ou o céu que nos envolve - separando-o em elementos autônomos, é própria da linguagem não astrológica a menos que nos limitemos à movimentos em um campo de classificações e tipografias, renunciando a toda síntese. Aprender astrologia implica traduzir um modo de organizar a percepção da realidade baseado em palavras da linguagem cotidiana, a uma ordem articulada em símbolos de maior complexidade. A linguagem cotidiana manifesta uma captação do mundo em entidades autônomas, enquanto que o simbolismo astrológico expressa outra muito diferente, na qual aparece muito aquilo que na percepção anterior estava revelado. A mesma estrutura das duas linguagens reflete o abismo que separa estas posições existenciais radicalmente diferentes.

Nossas linguagens habituais (espanhol, inglês, alemão, etc.) se baseiam na existência dos fonemas, partículas elementares irredutível das demais e as relações que estabelecem são externas à umas e respectiva à outras.

Nossa linguagem cotidiana não é em sua estrutura um sistema de ruas, nem é mandálico. Oferece a possibilidade de distinções absolutas e quem sabe aqui erradique sua maior afetividade e razão de ser, em relação ao mundo que temos acordado socialmente em definir como “objetivo”. Mas para nós, que estudamos astrologia - é esta precisamente sua limitação, ainda que seja operativa e necessária em um nível, já que sustenta a percepção de um mundo de entidades absolutamente separadas e cujas às únicas relações possíveis entre seus elementos são “externas” aos mesmos.

O sistema solar como paradigma funcional

Em astrologia cada símbolo relaciona diferentes tipos de realidade, desde as mais abstratas até as mais concretas; ao mesmo tempo denota espaços que, na divisão sujeito-objeto, denominamos “interno” e “externo”. No “interno” se incluem dimensões do inconsciente, tanto coletivas como pessoais, assim como atribuições psíquicas específicas (intelecto, afetividade, sensação de identidade, etc.). Por sua vez, no “externo” encontramos pessoas e vínculos, objetos, acontecimentos, aspectos da paisagem e a natureza, animais, metais e pedras. Finalmente sabemos que cada símbolo se relaciona também com uma parte do corpo humano. De um ponto de vista mais geral, cada planeta do sistema solar pode ser compreendido como parte de um sistema, tendo uma função específica nele.

Para a astrologia, o sistema solar é um paradigma funcional presente em toda a realidade, tanto “interna” (psíquica) como “externa” (mundo). No entanto, a matriz do sistema solar em sua totalidade se encontra em cada fragmento de si mesmo. Desta maneira, toda a função de um sistema particular - biológico, mecânico, psíquico, social - tem sua correspondência com o sistema solar.

Desta perspectiva, cada corpo do sistema solar ocupa um lugar funcional possível. Cada sistema - corpo, psique, família, sociedade e instituições, organismos viventes - possui sua Lua, seu Sol, seu Saturno ou Júpiter. Ou seja, aquilo que mais tarde a percepção habitual captará dissociadamente, como elementos separados da realidade ou como constituintes autônomos da consciência de si mesmo, surge uma matriz comum - o sistema solar - que se reproduz em todos os níveis e formas de nossa realidade cotidiana.

Em conseqüência podemos conceber a cada planeta como a função de um sistema. O que faz a Lua, terá significado no mundo “externo”: mãe, casa, lugar, útero, parto, etc. No “interno” se associará com a afetividade, a memória, as imagens psíquicas maternas, ou o arquétipo da Grande Mãe e aquilo que à associam. Mas todos estes elementos podem a sua vez ser sintetizados por um denominador comum em um nível mais abstrato; este denominador é a função da Lua, dentro do sistema.

Função
Mundo “Interno” -   Mundo “Externo”


Compreender a função sistêmica de um símbolo nos permite superar a dicotomia entre “subjetivo” e “objetivo”, possibilitando uma síntese entre as características psicológicas e as significações mundanas.

Qual é então, a função correspondente da Lua em qualquer sistema?



Las Lunas

Vamos voltar um pouco a algumas questões fundamentais na interpretação da mandala astrológica pessoal. A crença e conhecimento popular admitem as características solares como determinantes da personalidade como um todo, o que não pode ser entendido como verdade por aqueles que estudam e almejam conhecer mais profundamente a astrologia. Podemos a título de entendimento estudar os planetas, signos, casas, aspectos, etc., separadamente, mas na hora da interpretação tudo se mistura e cada mandala cria um enlace único e particular.

Cada parte isolada tem uma infinidade de aspectos a serem estudados. Começaremos com a Lua e suas múltiplas funções e significados. Para isso utilizarei o trabalho de Eugenio Carutti, um renomado astrólogo argentino, em seu livro “Las Lunas”, escrito em espanhol e traduzido por mim.